Chegou o verão, e com ele as férias. O ano que está acabando foi, para dizer o mínimo, atribulado; muitas coisas boas e poucos porém nada desprezíveis problemas. Foi um ano de muito trabalho, que já começou a dar frutos. Comecei com uma decisão simples mas um tanto trabalhosa, e termino com outra. Vejamos:
. Comecei o ano com um desafio autoimposto: tentar assistir pelo menos um filme por dia. Isso não é nada fora do comum, especialmente para cinéfilos: François Truffaut dizia que um dia bom era quando ele conseguia ver três filmes. Meu amigo, o roteirista Sylvio Gonçalves, tem o hábito de ver um filme por dia desde o tempo em que estudamos Jornalismo na Faculdade da Cidade, no Rio. Naquele tempo isso era um feito hercúleo, até porque o VHS era relativamente recente e, embora o ingresso do cinema fosse bem mais barato que hoje, o trabalho e a faculdade dificultavam essa tarefa. Já adianto que não consegui totalmente, mas passei de 300 filmes vistos no ano, número do qual nunca nem cheguei perto antes. Não pretendo repetir esse desafio em 2025, mas quero me propor algo que a Patrícia me desafiou no meio deste ano: ver uma porcentagem bem maior de filmes dirigidos e/ou protagonizados por mulheres. O mesmo para livros, aos quais me dediquei menos este ano em termos de quantidade, mas sem deixar de lado a qualidade. No começo de 2025 vou postar as listas completas de filmes e livros aqui.
. Em 2024 ministrei dois cursos livres: um sobre Mark Fisher e uma oficina de tradução literária. Os dois foram muito prazerosos para mim e, pela reação dos alunos, para elas e eles também.
. Em junho, visitei a China. Estive em Chongqing para ministrar, junto com colegas e amigos escritores de vários países, uma oficina dedicada somente à ficção científica, a Future Fiction Workshop. Foi uma viagem que me marcou e me abriu a cabeça. Acabei não postando nada a respeito à exceção de umas fotos no Facebook. Em janeiro vou escrever um post longo a respeito aqui.
. Academicamente foi um ano muito bom. Depois de um longo tempo sem publicar nada em revistas brasileiras, emplaquei um artigo na revista Zanzalá, da UNICAMP. Capitaneada pelo colega Alfredo Suppia, a Zanzalá é uma revista com foco em ficção fantástica, e nela eu publiquei a tradução do meu paper sobre Utopias Logísticas que saiu no livro Uneven Futures em 2022. No exterior, publiquei um paper sobre Ursula K. LeGuin e Kim Stanley Robinson na revista portuguesa Via Panorâmica, que pode ser lido de graça aqui. E também um artigo para a revista britânica Red Futures, sobre a série Andor, de Star Wars, analisando-a sob um viés marxista.
. Também foi um ano bom para meu grupo de pesquisa. Em 2024 o Observatório do Futuro ganhou um canal no YouTube, onde começamos a fazer entrevistas com pesquisadores de temas relacionados à ficção científica, e fizemos nosso primeiro colóquio em outubro. 2025 será um ano de muitos projetos para o Observatório.
. Este ano foi de poucas traduções, mas a qualidade do material mais que compensou: traduzi The Claw of the Conciliator, o segundo volume do Livro do Novo Sol, de Gene Wolfe. A saga começa a ser publicada em 2025, e em breve começo a tradução do terceiro livro, The Sword of the Lictor. Além desse livro, traduzi somente mais um: The book of elsewhere, escrito por ninguém menos que China Miéville e Keanu Reeves. Depois de A Cidade e a Cidade e Estação Perdido, eu não imaginava que Miéville voltasse a ser publicado aqui tão cedo, mas fico muito feliz de novamente ter podido traduzir esse autor de quem tanto gosto.
. Literariamente, foi um ano muito interessante. Em 2024 publiquei cinco livros. Dois foram reedições (um romance, Os Dias da Peste, e uma noveleta, O Inimigo Interno), um foi uma coletânea de microficções, Arquétipos de Massa: Labirintos, que levou 15 anos para ser publicada, uma biografia comissionada, O Poeta das Tesouras, que tive um prazer enorme em escrever, e por fim um romance steampunk inédito, O Torneio de Sombras, expandido a partir da novela Under Pressure, escrita em inglês e publicada por uma editora indie britânica em 2022, e que ganhou a primeira edição do Utopia Award em 2023, desbancando nomes como Becky Chambers. O Torneio de Sombras marca uma fase nova na minha carreira de escritor de ficção, e é o primeiro de uma série de livros ambientados no universo dos Oneironautas. Para 2025 já estão programados pelo menos mais um conto e um romance com as aventuras da oneironauta January Purcell.
. Além de iniciar um universo próprio, tive o prazer de participar de um universo criado por outra pessoa, o escritor e game designer J. M. Beraldo. Tive um conto publicado na antologia Além do Véu da Verdade, e gostei demais de escrever essa história – tanto que me ofereci para escrever mais, caso haja interesse dos leitores. Então agora depende de vocês.
E, fechando: a palavra do ano é RELEVÂNCIA. 2024 foi o ano em que entendi algumas coisas relacionadas a isso, e comecei a perceber melhor o meu lugar no mundo – algo incrivelmente difícil para mim, que ainda me esforço por entender melhor minha neurodivergência e o que ela acarreta. Aos poucos começo a compreender esse meu lugar – e a aceitá-lo, o que talvez seja a coisa mais difícil. A estrada não é fácil e seguimos: acredito que 2025 será um ano melhor, e vou trabalhar para que isso aconteça.

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